Por: Estevan Portela
Como muitos brasileiros, adquiri o hábito de, ao chegar do trabalho, ir para a frente da TV para assistir às notícias do dia. Mesmo que tenha lido o jornal da manhã, ouvido as notícias pelo rádio ou pela internet, assistir ao telejornal é como se fosse um balanço do que aconteceu no país e no mundo – apesar de achar que reprisam todos os dias o mesmo telejornal.
Entretanto, não me recordo da última vez que vi uma notícia que me fizesse sentir orgulho de nosso país. Pelo menos uma matéria que exaltasse um cidadão que achou e devolveu ao seu legítimo dono uma carteira, ou qualquer coisa assim, poderia ser reprisada eventualmente para minimizar a sensação de que não temos bons exemplos para mostrar.
Chego a acreditar que histórias de exemplos positivos não trazem audiência, mesmo sabendo que existem muitas boas histórias por aí.
Pelo contrário. Diante dos fatos que estão acontecendo com o Brasil nos últimos tempos, diariamente somos bombardeados por maus exemplos de toda espécie. Além do histórico das questões que envolvem a apropriação indevida de bilhões de reais dos cofres públicos, ainda presenciamos atitudes como a de um cidadão que, diante de uma vítima de acidente de moto, em vez de socorrê-la, tratou de furtar sua carteira, sem sequer querer saber se ela ainda estava viva. Cenas como essa nos dão vontade de nos alienarmos para não sofrer, porém, sem dúvida, se alienar não resolverá o problema.
Essa recorrência de péssimos exemplos que vemos a todo momento acaba por nos frustrar e ensinar às futuras gerações de que tudo isso é normal e que nossa cultura é lastreada no individualismo e oportunismo, fato que conflita com tudo que aprendemos ao longo de nossas vidas.
Diante desse contexto, fui levado a refletir sobre o significado da palavra “confiança” e, ao fazer uma breve pesquisa no dicionário, pude concluir que confiança é a crença na probidade moral, na sinceridade, lealdade, competência e fé. É a crença de que algo não falhará, de que é bem-feito ou forte o suficiente para cumprir sua função. É sinônimo de: atrevimento, segurança, crédito, familiaridade, intimidade e esperança.
Desde bebês, recebemos o carinho e afeto de nossos pais, com experiências de bem-estar e proteção. Construímos o vínculo de confiança que pode perdurar por toda uma vida. Salvo em situações específicas, nossos pais são as pessoas em quem mais confiamos.
Ao longo de nossas vidas, encontramos diversas pessoas nas quais passamos a confiar diante dos exemplos de sinceridade, lealdade e competência, entre outras virtudes que nos espelhamos e assim formamos fortes laços de amizade. É fato que encontraremos muitas pessoas nas quais não podemos confiar, mas diante do primeiro sinal, nos afastamos dessas ameaças e tocamos nossas vidas.
Ao transportarmos esses conceitos para o mundo corporativo nos deparamos com situações semelhantes. Uma empresa confiável é aquela que apresenta atitudes éticas, responsáveis e sustentáveis para todas as partes relacionadas como seus clientes; colaboradores e sócios/investidores e sobretudo a sociedade.
Essas atitudes permeiam a companhia em todas as suas camadas desde seu modelo de governança e controle, até atos mais simples de seus colaboradores, através do cumprimento de leis, respeito ao cliente e seus empregados, bem como cumpra seu papel para a sociedade.
Diante da ampla divulgação e velocidade das mídias, atualmente é muito comum empresas que ao longo de diversas gerações constroem uma imagem de empresa confiável, porém frente à uma falha causada por um gestor ou colaborador, processo ou desastre, venha a afetar e até destruir toda uma história de um relacionamento de confiança e conduta.
Um exemplo foi um incidente ocorrido há alguns anos com a “Operação carne fraca”, onde grandes marcas do ramo alimentício foram envolvidas em uma investigação e colocou em cheque a qualidade e credibilidade de seus produtos. Mesmo essas empresas terem se posicionado rapidamente, buscando os devidos esclarecimentos, o impacto foi gigantesco não somente para a credibilidade dessas empresas como também afetou todo um mercado, cujo setor era um dos poucos que vinham apresentando sinais de crescimento em uma economia bastante fragilizada. A pergunta é : Quanto tempo o mercado leva para recuperar a sua imagem e restabelecer a confiança?
Ao darmos mais um passo em nossa reflexão e olharmos no âmbito de um pais, constata-se que os princípios são os mesmos, principalmente pelo fato de que um país é formado por indivíduos e empresas.
A confiança em um país é o que motiva empreendedores nacionais e internacionais a investirem em empresas e projetos de longo prazo e assim movimentar toda uma economia, gerando emprego e renda.
A questão objetiva é: Quem coloca dinheiro em um pais cuja principal matéria amplamente divulgada em todos os veículos de comunicação são consecutivos escândalos de corrupção envolvendo toda a classe política e uma parte do segmento empresarial ?
Se considerarmos que os políticos que elegemos representam a sociedade, podemos concluir que a nossa imagem diante de outros países é refletida nesses representantes. Isso significa que perante outros países temos a mesma conduta desses nossos representantes.
Esse cenário causa grande frustração ao indivíduo que procura manter-se íntegro, ético, confiável e todos os adjetivos que formam um cidadão de bem, mas no final do dia vê tudo isso ir para a lama, diante dos fatos que vemos na mídia e nos compara aos indivíduos que elegemos como nossos representantes e que traíram a nossa confiança, delapidando os cofres públicos e ainda se intitulando como autoridades.
Essa contaminação retorna para nós e enfraquece toda a confiança que construímos, nos levando achar que todos fazem parte dessa categoria e a ter medo ou desconfiança de tudo e todos e diante de um simples ato de cordialidade de um estranho, passamos a achar que por trás dessa atitude pode haver uma segunda intenção. Mesmo sabendo que a grande massa de brasileiros são cidadãos honestos e dignos de confiança.
Portanto, se não interrompermos esse ciclo do mal, a começar da atitude mais simples de nosso dia a dia, em nossa casa, trabalho e sociedade com atos que retomem a confiança própria e ao próximo, poderemos chegar um dia que futuras gerações conhecerão a palavra “Confiança” somente em edições antigas de um dicionário.
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